A foto que não houve

Jonas saiu de casa para brincar no Carnaval de Olinda três dias atrás. O que sobrou dele está, neste momento, jogando num canto fedido da ladeira do MAC em pleno crepúsculo da terça-feira. Seus olhos verdes abrem, meio vesgos, tentando jogar um pouco de informação para seu cérebro avariado. Se já estava confuso com o burburinho da rua, agora as imagens em dobro só trazem o caos. De lado pessoas fazem cara de nojo para sua calça militar e sua camisa vinho imunda. Dois passos pra frente um casal se pega como se quisesse demolir o muro da casa. Então Jonas olha pra cima. Acho que ele me vê. Parece me fitar, pedindo ajuda. E eu, sob a proteção dos óculos escuros, nada faço. Finjo que revidar o jato d´água que a cowgirl loirinha atira em mim.

Então, o bravo brincante, levanta meio em falso e desaparece na multidão como se mais uma vez tivesse sido tragado pela baleia.

Mas eu, filho da puta como só eu sou, tive um único lamento. Não ter preparado e apontado a câmera para registrar aquela que teria sido a melhor foto do Carnaval 2006.

Ficção em primeira pessoa

Eu admito. Tomei ácido no carnaval 2006. Tomei, sim, e dos bons. Daqueles que em menos de um minuto embelezam todas as meninas até onde a vista alcança. Que levam pra longe os odores dos banheiros químicos Big Walley. Que esfriam a cerveja e de lambuja ainda dão um refresquinho no sol. Que transformam algumas das pessoas mais insuportáveis do mundo em amigos de longa data. Foi uma good trip daquelas, onde as ladeiras sujas de mijo e vômito se transmutaram em highways de propaganda de Corvette.

Só esqueci de perguntar qual era a marca do ácido. O pior é que, agora, fica muito mais difícil descobrir. As mulheres já embarangaram. O fedor de uréia queima as narinas. Só sobrou Nova Schin no fundo do isopor sem gelo e muito menos tenho vontade de perguntar pros meus amigos bissextos, que a essa altura nem mais amigos são.

Só me resta esperar o carnaval 2007.

Menina

Teus olhos refletem melancolia
Teu colo me alimenta e sacia
Teu sorriso inspira poesia
E tua presença
- Meses atrás, quem diria?!
Preencheu minha vida vazia.

Recife, 12 de fevereiro de 2006

Letra

“Sai, que eu já não te quero mais
Sai porque eu já descobri
Que posso viver sem ti
Que posso viver em paz
Muito bem sem o teu amor
Sai porque agora eu sou.
Um homem bem mais feliz (...)”

CAMELO, Marcelo. Descoberta. Faixa 3 in Los Hermanos. Abril Music. São Paulo. 1999.